Um inquérito publicado esta semana pelo INE (Instituto nacional de Estatística) revela que os Açores, em 2011, foram a Região do País com o mais baixo índice do poder de compra – 82,3%. No extremo oposto, encontra-se a Grande Lisboa, com 142% e os concelhos de Lisboa com 216% e Oeiras com 193%.
Numa leitura superficial, pode dizer-se que a capital portuguesa, devido à concentração das sedes das grandes empresas industriais, comerciais e financeiras e dos organismos do estado, tem o nível salarial mais alto do país, o que atraiu para a periferia da cidade gente de todo o lado para trabalhar em industrias e serviços que se criaram.
O fenómeno da concentração populacional no litoral do país, nomeadamente na Grande Lisboa e Grande Porto, provocou a desertificação e pobreza do interior. Concelhos do norte e centro como: Celorico de Bastos e Cinfães são os que possuem menor poder de compra – 49%, seguidos de Tabuaço e Ribeira de Pena com 50%.
Nos Açores, em 2011, o Nordeste sofreu também as consequências do isolamento e envelhecimento da população traduzidos num poder de compra muito baixo: 55%, bastante inferior ao do concelho de Ponta Delgada, com 104%, e o primeiro dos Açores.
A desertificação, para além da pobreza e do envelhecimento, está na origem da baixa da natalidade, da falta de trabalho, do abandono e degradação do património construído e dos terrenos férteis, do encarecimento de serviços e bens de consumo, dos cuidados de saúde diferenciados, do ensino e da educação.
Os malefícios da pobreza sobrecarregam fortemente os que menos têm.
A concentração urbana e de serviços, pode, no curto prazo, parecer um ato de boa gestão de recursos, porém, gera assimetrias insanáveis que se refletem no cumprimento de direitos fundamentais como o direito ao trabalho, à saúde e educação, e a uma ocupação sustentável das nossas ilhas.
Em janeiro de 2010 escrevia: “Uma grande dificuldade encontro no desenvolvimento de um novo paradigma para o Arquipélago: o envelhecimento da população e o decréscimo demográfico das ilhas menos populosas.
Temo que, com o rodar dos anos, as populações jovens com formação profissional ou universitária, tendam a abandonar ainda mais as suas ilhas de origem para se fixarem nos centros urbanos maiores.
Só concedendo condições muito vantajosas à concretização de projetos inovadores será possível contrariar esta tendência.”
Passados quase quatro anos, reconheço que a situação se agravou.
O saldo negativo da população de seis das nove ilhas mantém-se e, aliado ao envelhecimento, cada vez mais evidente, conduz, a passos largos, a um despovoamento irremediável.
O problema já não passa, apenas, pela esfera governamental. Ele é sentido pelos próprios idosos que se vêem completamente desamparados na etapa da vida em que necessitam de cuidados e carinhos redobrados.
Acresce também que o abandono das propriedades herdadas, constitui uma afronta a um valor antigo que todos prezam, pois faltam-lhes forças para tratarem das terras e não há camponeses que façam esse trabalho. Nem de graça se aceita terrenos de cultivo, só para não se encherem de canas e silvado...
As vantagens da biodiversidade não têm o mesmo valor, quando se perdem terrenos aráveis, de boa qualidade, que outrora deram pão a milhares e milhares de famílias.
A continuar assim, para que servem, na maioria das ilhas, os investimentos públicos em transportes e comunicações, na educação e formação, na agricultura, pescas e indústria se, amanhã, estarão sobre-dimensionados à população residente, e trarão enormes encargos com a sua manutenção?
Há que encontrar novas estratégias de desenvolvimento, a partir da descoberta das potencialidades naturais e humanas de cada ilha, capacitando os jovens para empreenderem novos negócios amigos do ambiente e da cultura local.
Este processo complexo implica ruturas. Desde logo, a substituição e cancelamento de investimentos em áreas que não trazem vantagens à fixação das populações. Depois, envolvendo todos, nomeadamente jovens e emigrantes no desenvolvimento das suas terras, tornando-os protagonistas do presente na construção do futuro.
Para tal, importa que os serviços públicos sejam parceiros, despojando-se da mentalidade de donos dos dinheiros de todos. Compete-lhes, portanto, facilitar processos e ajudar os empreendedores em tarefas urgentes que não se compadecem com visões concentracionistas.
Só o desenvolvimento descentralizado combaterá a desertificação que afeta grandemente a credibilidade na Autonomia e nos órgão de Governo próprio.
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